A perda do senso de humanidade: Pinheirinho destruído em 2012 é reflexo da negação do direito

 

A segunda quinzena de janeiro marca um dos episódios mais tristes protagonizados pela Justiça brasileira neste século XXI: a destruição do Pinheirinho por tropas da Polícia Militar de São Paulo. Na madrugada de um domingo, 22 de janeiro de 2012, oito mil pessoas foram retiradas de uma ocupação que começou a ser organizada em 2004 na cidade de São José dos Campos, localizada no Vale do Paraíba, no interior do Estado. Transformada em bairro, aquela porção de terra recebeu o nome de Pinheirinho, e se integrou ao cotidiano do município. Era uma área gigantesca, de 1,3 milhão de metros quadrados, registrada em nome da massa falida de Selecta Comércio e Indústria S.A., empresa pertencente a Naji Nahas, investidor que ganhou notoriedade por liderar uma sucessão de golpes contra a economia do País.

A desocupação do Pinheirinho aconteceu quando a situação do imóvel estava prestes a ser regularizada. Uma liminar da 6ª Vara Cível de São José dos Campos autorizava a reintegração de posse; outra liminar, da Justiça Federal, proibia a intervenção policial. No auge do conflito, o Tribunal de Justiça de São Paulo, pela sua Presidência, determinou, unilateralmente e à margem das normas processuais, a intervenção policial. Dois mil soldados, utilizando-se de um arsenal de guerra, executaram a ordem que lhes foi dada por uma autoridade administrativa. Essa operação, realizada “em nome da lei e da ordem” – ou da preservação do direito sagrado de propriedade –, jogou uma população inteira no olho da rua.

Caracterizou-se, nesse caso exemplar, o que Roberto Lyra Filho chama de negação do direito: “A legislação abrange, sempre, em maior ou menor grau, direito e antidireito: isto é, direito propriamente dito, reto e correto, e negação do direito, entortado pelos interesses classísticos e caprichos continuístas do poder estabelecido”.

Transcorridos oito anos, o local onde se deu o massacre continua abandonado.

 


Mário Montanha Teixeira Filho é consultor jurídico aposentado.

Acesse, aqui, o artigo A violência e a morte.