Salve, Jorge

Por Mário Montanha Teixeira Filho

 

Fui apresentado ao Jorge Curi no começo dos anos 1980. Nós éramos muito jovens, ele um pouco menos do que eu. Conversávamos de vez em quando na pequena cantina que funcionava no prédio do Tribunal de Justiça. Conversas breves, que me revelaram alguns segredos do serviço público, os caprichos de uma estrutura burocrática que tinha pouco a ver com o que havíamos aprendido ingenuamente na faculdade. Acumuladas experiências ainda pequenas, eis que nos encontramos na mesma sala, num dia que foi há muito tempo, para dividir processos, despachos, questões que emergiam da reformulação política que o País atravessava. Trabalhamos juntos por dois anos.

Mais do que os detalhes da Constituição de 1988 que nascia esperançosa, conheci os detalhes da vida do Jorge. Desnecessário enumerá-los aqui. As muitas pessoas que estiveram perto dele sabem dos grandes exemplos que ficaram. Admirei-o desde sempre, imensamente. Tornamo-nos amigos, e continuamos amigos mesmo quando momentos difíceis nos colocaram em lados opostos – eu me tornaria um sindicalista sincero, com erros e acertos, a combater as orientações administrativas que ele defendia. Nossas discordâncias, porém, ficaram num campo de disputas bem delineado, sem avançar para o ressentimento. Respeitamo-nos, algo que soa impensável nos dias que correm.

Numa das últimas conversas que tive com o Jorge, fiz-lhe uma advertência séria: “você está proibido de morrer”. Ele dizia, então, de todas as batalhas que enfrentou, do esforço que fez para compartilhar com a humanidade a beleza de estar vivo. Mas existem batalhas que não se vencem. Recebo, agora, a notícia de que o Jorge foi embora, carregado pela vaga sombria que nos assusta a todos, roubando-nos o direito à despedida. Não nos derrubaram, todavia. Seguiremos.

Obrigado por nos ensinar a resistir, Jorge Luiz Guérios Curi.